domingo, março 09, 2008

Velinhas e velhinhos

"As primeiras lembranças da vida são lembranças visuais. A vida, na lembrança, torna-se um filme mudo. Todos nós temos na mente a imagem que é a primeira, ou uma das primeiras da nossa vida."
(Pasolini em Gennarello: A Linguagem Pedagógica das Coisas)


Não sei porque, todo velhinho tem um quê de alguma coisa que me chama a atenção. Principalmente os jovens, bem humorados, contadores de causos.
Mas há aqueles já semi mortos. Segundo um amigo meu que trabalha num asilo de luxo, ele preferiria morrer do que passar a velhice lá, mesmo sendo bem tratado, com mordomias e comida boa. Estarem cercados de gente que significam nada em suas vidas e mortes rotineiras contribuem pra irremediável certeza de que estão na sala de espera da morte. De alguma forma abandonados e, aparentemente, bem conformados. Já meio mortos na realidade.

Imagino que nessas circunstâncias, em que já não se vive, mas sobrevive na medida em que morre cada dia um pouco mais, o entretenimento maior é lembrar. Mesmo os que tem alzaihmer. Lembranças de uma vida que foi e não é mais. Com tanto tempo ocioso, tão sem o que fazer e tão sem vida, eu mergulharia em retrospectivas anacrônicas e intermináveis. Viveria pelo menos em pensamento. Num asilo creio que não há muito o que fazer. Quem sabe um tabuleiro.

Há aqueles também que parecem estar cansados de sua vida e tentam viver as alheias. Sabe aquele vizinho aposentado que fica na calçada exclusivamente para observar e conversar com quem passa por ali, esperando o momento em que um ou outro vizinho chega ou sai de casa pra poder prosear. Observam, perguntam tudo, fofocam, sabem da vida de cada um do quarteirão, sempre iniciam uma ou outra frase com "na minha época", palpitam, especulam, falam da esposa, dos filhos, dos cachorros, dos gatos da vizinhança, das coisas desnecessárias, fazem favores espontâneos e mais um monte de coisa relacionada a vida alheia ou passada. E assim passam os dias. Talvez pra esquecer que estão ficando velhos. Não sei.

5 comentários:

Anônimo disse...

Parabens Thaiza, hehe eu também gosto de ouvir estórias, historia e porque não até filosofia de velhinhos jovens.

Anônimo disse...

Também gosto de escutá-los e ver que de repente de algum lugar o cenário dá uma repaginada e a trilha sonora desenterra um negócio que retoma o brilho no olhar e o viço dos rostos... Falando em saudades não quero que você seja uma lembrança naftalinada de minha vida então por favor, criemos celebrações.. beijo

Unknown disse...

Adorei suas reflexões, esse blog é coisa linda de deus

Anônimo disse...

Queria mandar um beijo pra minha mãe, pro meu pai e pra você.

Beatriz Pascon disse...

Pois é...quando a própria vida não basta ou já se vai, o melhor mesmo é cuidar da vida alheia...e eu já faço um pouco isso, mesmo no auge dos meus 21 anos.
Estou com saudades, que logo mais serão aniquiladas!
Aqui vai de presente a dica do dia: http://blogdeblindness.blogspot.com.....foda!
Beijos!!!