"O que leva na cabeceira da cama
Ali na escrivaninha
Embaixo da janela da alma?"
A parte mais legal de ter sido
livreira, além de se perder ao organizar as estantes, hábito que
desde a infância eu cultivava nas prateleiras de madeira e tijolos
que meu pai bancário havia construído, povoada por livros que minha
mãe professora havia trazido, eram as indicações bem acertadas.
Como era bom acertar na mosca! Como era bom as pessoas com tempo que
iam lá só para papear e pegar umas indicações suas. Em especial,
marcou uma amiga queridona que dia desses agradeceu por eu ter
apresentado a ela, hoje o que ocupa o lugar de seu livro preferido, O
Estrangeiro, do Camus.
Agradeço, por sua vez, a professora
que indicou a leitura, será que foi a Betina ou a Maria Luiza? Foi
no colegial. Fiquei instigada já na orelha do livro, quando
mencionou que The Cure tinha se inspirado nele pra fazer a música
Killing an Arab. Bateu a curiosidade, comecei a ler e fiquei tão
fascinada, que li durante a aula, de uma vez só. Depois das
primeiras páginas, grudei que não consegui parar meus olhos até o
chegar ao fim.
Há algo de mágico também quando você
encontra pessoas que compartilham do mesmo gosto literário que o
seu. Como se rolasse uma empatia imediata. Conheci uma pessoa que tem
uma tatuagem inspirada no Mito de Sísifo, achei tão bonito alguém
ter esse carinho pelo Camus, que foi simpatia a primeira vista. É
esquisito, é como se o autor querido fosse um velho camarada em
comum, e a relação entre você e quem gosta dele, é como se fosse
entre um amigo de um bom amigo seu.
Engraçado também, como essa
preferência muda com o tempo. Hoje em dia, já não sei se o
Estrangeiro é o livro preferido. Na época da primeira vez, causou
um rebuliço, foi algo tão extraordinário dentro no meu contexto,
tão diferente de tudo que eu estava habituada e falava tanto o que
eu nunca tinha conseguido verbalizar. Ainda não li outro que tivesse
esse efeito tempestuoso.
Li os cadernos diários do Camus recentemente, e foi
uma sensação tão gostosa, como se lesse cartas de um velho amigo.
Não mais a sensação de surpresa que te coloca de cabeça pra baixo
do avesso, mas algo que se aproxima mais um acarinhar de sensações
e afetos, quase como um acolhimento, um reconhecimento humano, um
tapinha sincero nas costas, “É... sei como é...”. Foi intenso, mas foi leve ao mesmo tempo, uma leitura cheia de suspiros e sorrisos de canto de boca. Me pergunto como teria sido o efeito da leitura na Thaiza de uns 13 ou 14 anos atrás.
Por fim, o livro preferido de hoje, é um lugar porvir.
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